O trabalho feito pelo Instituto de Ciências Sociais, da Universidade de Lisboa, a pedido da Fundação Calouste Gulbenkian, apresenta os hábitos de consumo de Cultura dos portugueses antes da pandemia.

Nove em cada dez portugueses revelaram ter, antes da pandemia, um “baixo consumo” de atividades culturais, e os chamados “omnívoros culturais” são sobretudo jovens ou com rendimentos mais elevados, segundo um estudo hoje divulgado.

Os dados constam do estudo “Práticas culturais dos portugueses”, feito pelo Instituto de Ciências Sociais, da Universidade de Lisboa, a pedido da Fundação Calouste Gulbenkian, a partir de um inquérito nacional sobre hábitos de consumo de Cultura dos portugueses, em particular nos 12 meses anteriores à pandemia da covid-19.

Um dos objetivos do estudo é permitir “discutir o que as políticas públicas têm vindo a fazer, o que ainda podem desenvolver, e aferir sobre os circuitos de criação e difusão que as sustentam”.

Ao longo de mais de 400 páginas, a equipa revela múltiplos dados e informações estatísticas sobre o comportamento dos portugueses no consumo de Cultura, concluindo que, na altura do inquérito realizado, “93% do total dos inquiridos se encontravam na categoria de ‘baixo consumo cultural'”, de atividades como teatro, ballet, dança, ópera, cinema, circo, concertos, festivais e festas locais.

Para explicar os hábitos de consumo dos portugueses, os autores do estudo recorreram aos termos “omnívoro” e “unívoro” cultural para falar dos consumidores que “apresentam uma orientação cultural mais diversificada” e dos que demonstram “uma menor frequência nas práticas culturais”.

Segundo o estudo, os consumidores omnívoros “são mais vezes estudantes e trabalhadores, com os rendimentos do agregado familiar mais elevados; e, em termos de classe socioprofissional, identificamos um eco mais forte de omnivorismo nos profissionais socioculturais”.

Por outro lado, os consumidores unívoros são sobretudo os inquiridos a partir dos 65 anos, que se identificam mais frequentemente como “domésticos não remunerados ou reformados”, e com níveis de escolaridade mais baixos.

No estudo, sublinha-se que “o consumo cultural é socialmente estratificado” e que “a origem e posição social dos indivíduos, tendo em conta o nível de escolaridade dos pais, amplia os efeitos do capital escolar do próprio, reproduzindo velhas clivagens sociais e culturais, e, até certo ponto, limitando a progressão da frequência das gerações intermédias e mais antigas”.

Os autores constataram ainda que “quando os pais têm um nível de escolaridade superior, aumenta quase quatro vezes mais a hipótese de um indivíduo ter uma orientação de consumo cultural omnívoro, quando comparado com indivíduos cujos pais têm uma escolaridade inferior”.

Assim, mais de metade dos portugueses não lê livros, uma realidade que está fortemente associada à educação, já que muitos não têm memória de os pais alguma vez os terem levado a uma livraria ou lhes terem oferecido um livro. 61% dos portugueses não leram um único livro em papel, e, dos 39% que afirmavam ter lido, a maioria leu pouco.

Quando questionados sobre a leitura de livros digitais, a percentagem desce ainda mais, com apenas um em cada dez inquiridos a responder que leu nesse suporte.

As conclusões do presente estudo apontam igualmente para a existência de uma relação entre a educação e os hábitos de leitura, já que, na sua infância e adolescência, a maioria dos inquiridos não beneficiou de estímulos à leitura gerados em contexto familiar.

Já no outro extremo, a ida ao cinema foi a atividade cultural com maior taxa de participação dos portugueses, mas o principal concorrente é a televisão, pelo menos antes da pandemia.

Entre as razões apontadas para não irem mais vezes ao cinema estão a falta de tempo, de interesse, o preço elevado dos bilhetes e a não existência de cinemas na zona de residência.

Há ainda outra justificação de relevo: vinte por cento dos inquiridos disseram que podiam ver “o filme em casa na televisão e noutros suportes digitais”.

Por seu lado, os festivais ou festas locais foram os espetáculos ao vivo a que mais inquiridos (38%) disseram ter assistido, seguindo-se os concertos de música ao vivo (24%).

Em relação aos festivais, “em geral, são os inquiridos do sexo masculino, dos grupos etários mais jovens, entre os 15 e os 34 anos, e com um perfil omnívoro (que apresentam uma orientação cultural mais diversificada) que dizem terem frequentado esta prática cultural”.

Quantos aos níveis de escolaridade, “destacam-se os que possuem ensino secundário e superior” e, no que à geografia diz respeito, “é a participação dos inquiridos residentes na região do Alentejo que mais sobressai”.

Já sobre as festas locais, “são os inquiridos com mais de 65 anos, com o terceiro ciclo, que têm uma adesão mais expressiva, se comparado com outras práticas, das quais estão ausentes ou associados a um perfil de participação cultural unívoro (demonstram uma menor frequência nas práticas culturais)”.

Em relação aos concertos de música ao vivo, os que têm taxas de frequência mais elevadas são os de “pop-rock”, mais frequentados por homens, entre os 25 e os 34 anos, com o ensino secundário ou superior. Também os concertos de jazz são mais frequentados por homens, que têm entre os 15 e os 24 anos, o ensino superior ou secundário e que residem na Área Metropolitana de Lisboa.

No que à música clássica diz respeito, o público é maioritariamente feminino, com idade entre os 55 e os 64 anos, e com o ensino superior.

Por outro lado, os concertos de rap e hip-hop interessam sobretudo a um público masculino, com idades entre os 15 e os 24 anos e que tem o terceiro ciclo de escolaridade.

O público é maioritariamente feminino também nos concertos de música africana, música popular brasileira e fado. Já os de música latino-americana são mais frequentados por homens.

https://gulbenkian.pt/agenda/praticas-culturais-dos-portugueses/

Fonte: Fundação Calouste Gulbenkian

Liliana Teixeira Lopes