Foi a questão que colocou um projeto da Bulgária e a conclusão não é nada animadora.

Será que a música alta incomoda mais do que a violência doméstica?

As estatísticas indicam que, na Bulgária, 1 em cada 4 mulheres é vítima de violência doméstica e que nos últimos cinco anos dezenas de mulheres foram mortas pelo seu parceiro ou por um familiar – “em alguns casos, foram torturadas até à morte durante uma hora, com os vizinhos plenamente conscientes de isso mas sem interferir”, lê-se no site do projeto Beat.

E o que é o projecto Beat?

Dois búlgaros – Maksim Stoimenov, baterista, e Peruna Keremidchieva, programadora – criaram em colaboração com vítimas de violência doméstica um projeto artístico que mais uma vez lembra esse flagelo escondido e tão carregado de tabus com uma ação simples mas tocante.

Constituído por uma instalação e por um vídeo, o projecto – intitulado “Beat.” – assenta numa mensagem forte: os vizinhos de um prédio são mais capazes de reagir a uma bateria a tocar a ‘todo o gás’ do que a agressivas discussões domésticas.

Para demonstrar isso mesmo, os artistas alugaram um apartamento num edifício habitacional, onde uma mulher tinha sido recentemente morta pelo companheiro, uma morte que resultou de 50 minutos de maus tratos… Maus tratos é pouco – de tortura. Nesse apartamento os artistas tocaram bateria até que alguém lhes fosse tocar à campainha, a reclamar.

O vídeo documenta esta ‘experiência social’ e o colectivo garante que aconteceu como é mostrado.

No final, a conclusão é esta: 1 minuto e 52 segundos pode ser o tempo necessário para salvar uma vida – foi, exatamente, 1 minuto e 52 segundos depois de terem começado a tocar bateria que alguém foi tocar à porta.

O trabalho de Maksim Stoimenov e Peruna Keremidchieva, membros da fundação Fine Acts, foi visto por mais de 120 mil utilizadores no espaço de um ano, segundo contas feitas por uma rádio búlgara.

À rádio BNR, Maksim Stoimenov explicou: “O nosso vídeo mostra um sítio onde algo horrível aconteceu – filmámos num edifício de apartamentos onde uma das muitas mulheres na Bulgária foi morta. Alugámos um apartamento aí e, sem avisar os vizinhos, decidimos ver quanto tempo demorariam a reagir se tocássemos bateria. Em comparação com os 50 minutos que o homicídio demorou, tempo durante o qual houve gritos e gritos, demorou menos de dois minutos para os vizinhos reagirem à bateria. Se tivessem reagido da mesma forma à violência doméstica, o resultado poderia não ter sido fatal.”

Afinal, depois de isto, parece-me a mim que, ironicamente, a música alta incomoda mais do que a violência doméstica.

https://projectbeat.org/

Fonte: Project Beat. / Shifter

Liliana Teixeira Lopes